quarta-feira, 30 de abril de 2008

Ainda a publicidade nas escolas

Há poucos anos vi aqui um documentário sobre a MTV e a ideia de fazer os jovens pagarem a publicidade para a valorizarem, uma vez que a técnica do pé na porta funciona cada vez pior.

Bombardeadas à esquerda e à direita com anúncios, e fartas de serem enganadas (99% da publicidade é enganosa) as pessoas criam filtros e desligam cada vez que um 'marketer' lhes desata a gritar mentiras aos ouvidos sobre um detergente que restitui as cores das roupas, uma pasta de dentes que os faz mais brancos, um cereal que faz os anões crescerem, uma marca de cerveja que transforma os desdentados em sex symbols, etc.

A maioria das toneladas de papel que nos enfiam entre os jornais e as revistas, ou as que nos enfiam directamente na caixa do correio vai para o lixo sem ser sequer aberta. Os envelopes a anunciarem que ganhámos um carro, uma fortuna, um lingote de ouro, ou que fomos pré-seleccionados para recebermos umas férias absolutamente grátis algures são ignorados por todas as pessoas com um QI acima de 60. Os telefonemas a dizerem que ganhámos um telemóvel desligados na cara das telefonistas.

Se nos serve de consolo, a vida dos miseráveis que nos atormentam com mentiras sobre detergentes e marcas de whiskey não é fácil.

Os psicólogos que trabalham em publicidade levam uma existência ignóbil a estudarem maneiras de vender as porcarias todas que as empresas nos impingem.

Uns agora resolveram que a melhor ideia para tornarem os mais estúpidos entre nós em consumidores compulsivos era incorporarem as marcas de roupas em programas de televisão sobre música rock e tentarem vender os produtos em pacotes, associados a um estilo de vida que eles próprios inventam e reinventam em programas sobre as coisas de que "os jovens" supostamente "gostam".

Outros metem, por exemplo, roupas de uma determinada marca num jogo de computador on-line e sujeitam as crianças a modelos, cores e logotipos que elas depois reconhecem quando passam pelas montras das lojas nos centros comerciais.

Outros ainda metem publicidade subliminar na internet.

Outros põem uma mulher quase nua num cartaz e depois anunciam qualquer coisa: funciona sempre. Pelo menos com homens e com lésbicas esfaimados por uma boa...

A baixeza e a agressividade descarada dos 'marketers' não têm limites.

Os 'marketers' fazem qualquer coisa por dinheiro, descem a qualquer nível, cometem qualquer crime. Com os tele-evangelistas, os 'marketers' são hoje em dia indisputadamente os seres mais ignóbeis e mais desprezíveis dos EUA. Desprovidos de consciência e de coluna vertebral, são capazes de qualquer coisa por dinheiro e as pessoas tratam-nos como os répteis que eles são.

Em Portugal não. As pessoas mandam anúncios umas às outras por email, como se fossem obras de arte.

A falta de sentido crítico dos portugueses é proverbial e proporcional à crendice supersticiosa dos indígenas. Portugal deve ser o único país do mundo civilizado em que os bispos benzem as pontes (o resto fá-las construir por engenheiros competentes).

Mas obrigar os alunos a verem e a "estudarem" anúncios na escola pública está abaixo de tudo o que já vi e li.

Pessimismo de esquerda....

Bem sei que Pacheco Pereira acha que a diferença entre esquerda e direita é que nós somos pessimistas e eles são de um optimismo realista (e progressista) louvável.

Mas eu li isto num dos meus blogs preferidos (wehavekaosinthegarden):

"(...) A crise mundial do capitalismo global está aí, (nem era necessário ser economista para ver que esta globalização acabaria por alastrar a pobreza e arrasar com os mercados), o petróleo já quase batei nos 120 dólares por barril, o dólar afunda-se, os preços das matérias-primas e dos alimentos não para de subir assim como os juros. O desemprego aumenta e a única coisa que desce é o nosso poder de compra com os salários as não acompanharem a inflação (nem a mentirosa, onde metem montes de produtos supérfluos só para esconder a realidade, porque a verdadeira, a que tem a ver com o mais importante que é a alimentação, dessa nem vale a pena falar)."

E eu - certamente ferido do pessimismo atávico dos esquerdistas - concordo plenamente: o capitalismo tem de ser regulamentado senão acaba SEMPRE por acelerar desenfreadamente e apontar à primeira parede, como a história demonstra até à exaustão. Cada vez que o mundo cai nas mãos de um cartel de gananciosos as coisas acabam em crises gigantescas.

Vem um artigo na Harper's deste mês que explica que se o cabaz que se usa nos EUA para determinar a inflação incorporasse a energia e os bens alimentares, os EUA - esse milagre económico dos monetaristas - tinham neste momento 9% de inflação (e quase 10% de desemprego).

Roger Ailes, o presidente da máquina de propaganda FOX "News" Channel, que organizou o golpe de estado que levou Bush ao poder em 2000, passa os dias a repetir a máxima pós-moderna: "nós fazemos a realidade americana; se não reportarmos um acontecimento, será que ele aconteceu?"

Agora parece que a realidade está, devagarinho, a bater-lhes à porta...

Mas não nos devemos precipitar a julgar esta situação em termos apocalípticos antes de ouvirmos os nossos sábios do costume: Z.M. Fernandes, J.A. Saraiva, Pacheco Pereira, ou talvez mesmo João Carlos Espada tenha alguma notícia de Oxford que nos permita adquirir uma compreensão mais profunda da situação.

Ou talvez César das Neves e o Dr. Arroja nos possam explicar este fenómeno em termos duma vingança de Deus (uma manifestação da Sua infinita bondade) por causa da promiscuidade dos homens-sexuais, da imoralidade das mães assassinas de bébés, ou da falta de um Salazar que metesse os liberais, destruidores da família, na ordem?

Esperemos pelo próximo número da revista Atlântico!

terça-feira, 29 de abril de 2008

Da escola como intervalo publicitário

  • «Quase uma em cada cinco escolas do ensino básico conta já com o programa de ensino de publicidade, o Media Smart, dois meses depois de o módulo ter sido introduzido, anunciou hoje a associação de anunciantes. Segundo a entidade, o primeiro módulo do Media Smart está a ser ensinado em 1101 escolas públicas e 67 privadas, sendo que, no total, existem em Portugal cerca de 6500 escolas dos primeiros e segundo ciclo. (...) O programa Media Smart destina-se a desenvolver as competências das crianças para interpretar mensagens publicitárias, sendo constituído por três módulos que abordam diferentes vertentes da publicidade - introdução à publicidade, publicidade dirigida a crianças e publicidade não comercial. O programa arrancou oficialmente no dia 21 de Fevereiro, numa iniciativa da APAN e do Ministério da Educação, e visa dotar os alunos do 1.º e 2.º Ciclos de ferramentas que lhes permitam compreender e interpretar a publicidade, com o objectivo de "fazer escolhas mais conscientes".» (Público)
Se não parecer mal, gostaria de pedir à Sra. Ministra da Educação que encontre tempo, por exemplo no intervalo entre dois programas publicitários, para se ensinar, sei lá, Matemática ou Português. Sem desmerecer do papel importantíssimo que tem a «matéria» publicidade para o desenvolvimento das capacidades cognitivas das criancinhas, claro, e do seu futuro enquanto cientistas, técnicos, advogados ou médicos.
E não posso também deixar passar esta ocasião sem assinalar o espírito desinteressado, quiçá mesmo altruísta, com que empresas como a Danone, a Nestlé, a Kellog´s, a McDonald´s, a Porto Editora e os Hipermercados Modelo Continente patrocinam esta iniciativa. Tenho a certeza de que não esperam receber nada em troca.

Surpresa

Neste estudo encontrei a seguinte tabela:



Geralmente acredita-se que quanto mais jovem é um eleitor, maior a probabilidade de ser «de esquerda». Há quem justifique tal crença numa alegada viragem à direita que vai acontecendo com à medida que se envelhece, passando do idealismo sonhador ao pragmatismo temperado pela sabedoria da idade. Sempre me pareceu que esta justificação era disparatada, mas não sabia que o fenómeno que pretendia explicar era inexistente.

Pelo contrário: quanto mais velho é o eleitor, maior a probabilidade de ser de esquerda. Esta tendência ainda é mais significativa no que respeita à extrema esquerda, contrariando a noção comum de que os jovens têm tendência a ser os mais extremistas.

Será porque quanto mais velhos os eleitores, maior a probabilidade de terem contactado com o antigo regime, e toda a miséria e opressão que lhe estão associadas? Atendendo a que a oposição a este regime está mais associada à esquerda, essa poderia ser uma razão.
Ou será que é precisamente por os mais velhos serem maioritariamente de esquerda que os mais jovens não o são? Será um efeito geracional de afirmação de valores opostos aos da geração anterior, ou um simples efeito estatístico de regressão à média? Ou a causa deste fenómeno terá outra explicação?

Que razões justificarão esta tendência?

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Raúl Proença: «O partido republicano e as crenças religiosas»

Continuando a obra deste blogue de divulgação do pensamento de Raúl Proença, segue mais este texto.
  • «(...) [sobreexiste] ainda hoje uma lamentável confusão entre os partidos políticos e as crenças religiosas, confusão que tem sido propositadamente favorecida pelos clericais e cegamente mantida por ingénuos ou fanáticos.
  • (...) um partido democrático não pode nem deve impor aos seus correligionários nada mais do que a observância rigorosa de certos princípios fundamentais, sem os quais esse partido não tem razão de existir.

    Nós admitimos perfeitamente essa imposição máxima (se imposição se pode chamar a uma definição clara de atitudes), que não denota nenhuma intolerância. Os padres da Igreja não são intolerantes excomungando aqueles que divergem de uma maneira absoluta dos seus princípios admitidos. A sua Igreja tem uma acção, um destino, uma missão a cumprir; fora dela pode admitir outras acções, outros destinos, outras missões diferentes; mas o que não permite é que se suponha filiado na sua Igreja quem está em contradição com o que constitui a alma da própria Igreja. Excomungar é pois, dentro de limites prescritos, reconhecer uma divergência que os crentes foram os primeiros a levantar; como ninguém os obriga a concordar com as máximas fundamentais da Igreja (de outra maneira não seriam excomungados, mas forçados a comungar), é de um certo modo sancionar a liberdade de discussão; e representa, sob o ponto de vista moral, a disposição dessa Igreja em não colaborar na hipocrisia de um indivíduo que, tornando-se incompatível com os princípios da sua seita, insistisse em dizer-se inspirado no espírito restrito da seita.

    Por isso, se um republicano começasse para aí a defender a intolerância religiosa, as ditaduras políticas, o regime de perseguição, não era apenas um direito, mas um dever do directório do partido, depois de o ter inutilmente esclarecido, excomungá-lo da sua agremiação política, dizendo-lhe: nós respeitamos de uma maneira absoluta a sua liberdade de consciência; dizemos-lhe mais: para nós a sua liberdade de consciência, como a liberdade de consciência de todos os homens, é a coisa mais preciosa do mundo. Pode ser mesmo que tenha razão e que todos nós laboremos no erro; pois bem: a melhor maneira que o senhor tem de manifestar a sua razão e o nosso erro é confessar que não pertence ao nosso partido. Quando todos nós erramos, seria uma insistência imbecil querer sujeitar-se ao nosso rótulo - que é o nosso erro. Antecipamo-nos pois, e acreditaremos, para não ter de duvidar da sua inteligência, que fizemos o que mais grato seria à sua vontade esclarecida.

    Mas esta obediência querida, livremente consentida e livremente aceite, esta obediência que não é propriamente obediência, porque não representa uma sujeição servil, mas um acordo consciente e voluntário em determinados princípios «centrais» e «primordiais» de um partido democrático, levar-nos-á a estabelecer dentro dele uma «uniformidade» lata, de maneira que modos de pensar, de sentir, de compreender a vida, e de a viver, apresentem uma identidade absoluta? Nós que o quiséssemos, e ser-nos-ia impossível. Fosse possível, e mal de nós se o quiséssemos.

  • (...)» (Raúl Proença, Alma Nacional nº21, 30 de Junho de 1910)

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Religião

Eu escrevi aqui em baixo que acredito que as pessoas não precisam de religião para se matarem umas às outras e que a religião é só um meio, um pretexto, uma ideologia à volta da qual os sociopatas se podem juntar para planearem e executarem os genocidiozinhos que tanto almejam.

Mas justamente por isso a ausência de religião organizada é um factor de paz social indiscutível. Desde que a religião na Europa se tornou numa coisa pessoal, misturada com elementos “new age” como as medicinas alternativas, a astrologia e as religiões orientais, arregimentar as massas contra as minorias tornou-se quase impossível para os populistas.

Como dizia Bertrand Russel, é muito difícil organizar um grupo de pessoas bem informadas em volta de um líder, sobretudo se esse líder se prepara para invadir um país ou apoiar uma guerra em que os filhos delas poderão morrer.

Hoje em dia, com as igrejas vazias e os cultos aeróbicos a proliferarem, o poder do papa ou o da rainha de Inglaterra residem nas relações deles com as elites económicas, através do Opus Dei ou da casa dos lordes... em Inglaterra apenas 1.5% da população se declara membro da igreja anglicana.

Nos EUA encarnados (a América rural) os criminosos e os aldrabões da Moral Majority ainda têm uma influência enorme nas pessoas e ainda conseguem juntar milhões à volta de uma ideia tão estúpida como a invasão do Iraque.

Claro que nunca se deve subestimar a estupidez nem a maldade das massas, mas eu espero que na Europa os populistas e os nacionalistas tenham de suar muito mais para nos convencerem da necessidade de uma guerra contra o Islão.

O carinho com que os sarkozis e os berlusconis tratam o (hipotético e maioritariamente inventado pelos media) ressurgimento da religião explica-se por esta razão muito simples: o fascismo é muito mais simples se houver uma máquina de propaganda organizada que o sirva. Mas será possível multiplicar Fátima e Lourdes por 100 só através da propaganda difundida pelos media? Quantas vezes é que se pode canonizar a irmã Lúcia?

Parece-me que os doutores arrojas de Bruxelas vão ter de empobrecer a classe média muito mais, destruir o ensino público completamente e reinventar a religião de estado.

Claro que isto não são tarefas impossíveis. Hitler e Estaline organizaram as máquinas de propaganda deles de raiz (a de Estaline a partir do zero), com terrorismo de estado, genocídios e investimentos tremendos de tempo e energia, e eu acredito que estas máquinas funcionam lindamente desde que não haja classes médias educadas.

Mas considerando o passado de tribalismo sanguinário dos europeus acho difícil ver os ingleses a lutarem contra os inimigos dos alemães, e os espanhóis e os italianos a apoiarem os ingleses...

34


25 de Abril, 34 anos.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Ao Directório o que é do povo

  • «Francisco Louçã acusou o primeiro ministro de "confiscar" o que foi prometido a todos os portugueses, o direito de votarem em referendo. Louçã afirmou ainda que o tratado quer uma "Europa diminuída e autoritária", com "o liberalismo mais agressivo" a vingar, como se vê na troca do "direito ao emprego" pelo "direito a procurar emprego", uma política que o governo português prossegue com a revisão do código de trabalho.» (Esquerda.Net)
  • «"Nunca se esqueça que a soberania é do povo e que o povo há-de pedir a reposição dessa soberania", considerou Jerónimo de Sousa. O líder comunista defendeu também que Portugal "transfere para Bruxelas a gestão dos recursos biológicos marinhos". (...) A perda de soberania seria ainda um tema focado pelo socialista Vitalino Canas: "Os poderes que são transferidos para as instituições da UE não se perdem, apenas se transformam: passam a ser exercidos em comum".» (Diário de Notícias)

Suave, suavemente, a soberania vai passando dos cidadãos para os governos do Directório (Alemanha, França, Reino Unido e Itália). Dizem que é «exercida em comum». Na realidade é exercida por outrém. Um dia acordaremos com o parlamento português transformado numa mera câmara ratificadora das decisões de Bruxelas. E então os cidadãos reclamarão a soberania que lhes retiraram e que lhes pertence. Esperemos que não doa muito.

A propósito da Guerra Civil de Espanha...

...e de um comentário pio sobre "ramos cortados e queimados" por Deus, lembrei-me do discurso de Millán Astray em 1936:


"¡Cataluña y el País Vasco, el País Vasco y Cataluña, son dos cánceres en el cuerpo de la nación! ¡El fascismo, remedio de España, viene a exterminarlos, cortando en la carne viva y sana como un frío bisturí!"

O José Estaline também adorava esta metáfora - e os comunistas usaram-na contra os membros da FAI.

Gostos não se discutem, mas eu prefiro a resposta de Miguel de Unamuno:


"Acabo de oír el grito negrófilo de "¡Viva la muerte!".
Esto me suena lo mismo que "¡Muera la vida!". Y yo, que he pasado toda la vida creando paradojas que provocaron el enojo de quienes no las comprendieron, he de deciros, con autoridad en la materia, que esta ridícula paradoja que me parece repelente. Puesto que fue proclamada en homenaje al último orador, entiendo que fue dirigida a él, si bien de una forma excesiva y tortuosa, como testimonio de que el mismo es un símbolo de la muerte. ¡Y otra cosa! El general Millán Astray es un inválido. No es preciso decirlo en un tono mas bajo. Es un inválido de guerra. También lo fue Cervantes. Pero los extremos no sirven como norma. Desgraciadamente hay hoy en día demasiados inválidos, Y pronto habrá más si Dios no nos ayuda. Me duele pensar que el general Millán Astray pueda dictar las normas de psicología de las masas. Un inválido que carezca de la grandeza espiritual de Cervantes, que era un hombre, no un superhombre, viril y completo a pesar de sus mutilaciones, un inválido, como dije, que carezca de esa superioridad de espíritu, suele sentirse aliviado viendo como aumenta el numero de mutilados alrededor de él (...) El general Millán Astray quisiera crear una España nueva, creación negativa sin duda, según su propia imagen. Y por ello desearía una España mutilada..."

quarta-feira, 23 de abril de 2008

O Tratado vai ficar tratado

O «Tratado de Lisboa», anteriormente conhecido como «Constituição da União Europeia», será hoje aprovado no Parlamento. Não houve qualquer debate público significativo, nenhum partido tentou mobilizar os cidadãos a favor ou contra, o prometido referendo foi esquecido. Mais uma vez, confirma-se que, em Portugal, a Europa não se discute. Um Parlamento Europeu sem capacidade para iniciar leis, forças armadas europeias sujeitas aos EUA (via OTAN), a diminuição do peso português no Conselho Europeu (que, ao contrário dos Senados das federações democráticas, não tem um igual número de representantes por Estado), o nivelamento por baixo dos direitos laborais, o «mercado livre» como valor, a ausência de uma norma laicista num texto para-constitucional, são todas questões que mereceriam ser discutidas empenhadamente. Parece que nada disto interessa aos cidadãos portugueses.
Para saber mais sobre o Tratado, clicar aqui.

terça-feira, 22 de abril de 2008

E a propósito do último comentário...

...Bukowsky! :o)

what can we do?

at their best, there is gentleness in Humanity.
some understanding and, at times, acts of
courage
but all in all it is a mass, a glob that doesn't
have too much.
it is like a large animal deep in sleep and
almost nothing can awaken it.
when activated it's best at brutality,
selfishness, unjust judgments, murder.

what can we do with it, this Humanity?

nothing.

avoid the thing as much as possible.
treat it as you would anything poisonous, vicious
and mindless.
but be careful. it has enacted laws to protect
itself from you.
it can kill you without cause.
and to escape it you must be subtle.
few escape.

it's up to you to figure a plan.

I have met nobody who has escaped.

I have met some of the great and
famous but they have not escaped
for they are only great and famous within
Humanity.

I have not escaped
but I have not failed in trying again and
again.

before my death I hope to obtain my
life.

from blank gun silencer - 1994

Matar padres...

Sobre os comentários ao meu textozinho sobre Richard Dawkins gostava de clarificar uma coisa importante. Eu não acho que a religião seja a raiz das violências que se cometem em nome deste ou daquele Deus. Não tenho quaisquer ilusões: no dia em que acabassem as religiões as pessoas começavam-se a matar umas às outras por outros motivos quaisquer. As pessoas matam-se por causa do futebol.

Mas a religião é um veículo e as organizações religiosas não conseguem evitar problemas relacionados com poder e com dinheiro. Defender a ideia de que as organizações religiosas são grupos de pessoas preocupadas com questões etéreas, relacionadas com as coisas do espírito, é uma falácia. As organizações religiosas são burocracias com gestores e controladores de custos, cash-flows e contas nos bancos, interesses imobiliários e portfolios de accões.

As brutalidades entre republicanos e católicos são proverbiais e ambos os lados têm tentado justificar estas selvajarias injustificáveis aumentando as estatísticas das brutalidades do outro lado. Não quero começar aqui a discutir quantas igrejas é que se queimaram, mas quem esteve lá - George Seldes, por exemplo - dá números muito diferentes dos do franquismo.

Mas isto não é o importante para o meu argumento. O que interessa para a nossa discussão é que quando há guerras as pessoas fazem coisas horríveis umas às outras. Chamar vítimas aos padres e às freiras e criminosos aos republicanos é uma injustiça tremenda. Muitos padres incitaram à violência e defenderam a revolução franquista, muitos pegaram em armas. E a ICAR incitou os espanhóis à violência. Exactamente na mesma medida que os comunistas e os republicanos mais selvagens, muitos padres foram instigadores de uma populaça analfabeta, que fez as coisas mais horríveis aos vizinhos e aos amigos em nome dos interesses duma organização medieval como era a igreja espanhola dos anos 30 - que ainda ensinava o modelo aristotélico na universidade, com o Sol a orbitar em volta da Terra.

Sobre este assunto - das brutalidades cometidas nas guerras por pessoas que são meros actores sem ideologia - vale a pena ler a autobiografia de Gunter Grass, ou o livro de Italo Calvino Il sentiero dei nidi di ragno (só sei o título em inglês). Ou ver o filme La lengua de las mariposas.

Assim, ilibar um lado ou o outro de brutalidades, muitas vezes disparatadas, é uma grande asneira histórica, julgo eu. Sobretudo quando se fala de uma organização extremamente bem organizada como a ICAR, com mil anos de experiência em geopolítica e que nunca se coibiu de mentir, perseguir, queimar, assassinar ou organizar guerras e invasões quando os seus interesses estavam em jogo.

Agnósticos

Houve um comentário anónimo interessante sobre esta questão dos árabes e dos turcos, que eu digo serem maioritáriamente agnósticos, e que merece dois ou três parágrafos, acho eu.

A minha universidade - o programa de arqueologia náutica - tem um centro na Turquia e relações permanentes de trabalho e de amizade com centenas de turcos. E os turcos são maioritariamente agnósticos, como o resto dos europeus. E manifestam-se na rua contra os mulahs mais odiosos, como eu gostava que os protugueses se manifestassem contra os bispos mais homofóbicos ou com mais ódio aos direitos das mulheres.

Deixem-me explicar: eu acredito que a maioria das pessoas que vai à missa (ou à mesquita, ou à sinagoga) nunca pensa nas questões teológicas que revoltam as elites e estão na origem de guerras e genocídios. Cada um tem uma relação simples com um "amigo imaginário" a quem chama Deus. A maioria não está disposta a matar ou a morrer pela religião, nem a impor o "amigo imaginário" a ninguém pela força.

A minha mãe - católica toda a vida - jura que a hóstia não é mesmo o corpo de Cristo, que é uma coisa simbólica, etc., e eu não lhe consigo explicar quantas pessoas é que foram perseguidas e queimadas por defenderem esta gravíssima heresia. Ela não acredita que os "santos padres" queimassem ninguém por causa de uma coisa tão tangente à "fé" dela.

No caso dos muçulmanos, estes últimos oito anos de insultos e provocações, invasões e humilhações, serviram lindamente os interesses de uma minoria de mulahs criminosos e sociopatas e inspirou uma data de desgraçados a fazerem coisas horríveis, crimes hediondos, selvajarias medievais. O desespero combinado com a impotência forma uma mistura sempre perigosa.

Mas os habitantes do Irão e do Iraque e da Malásia e da Indonésia não são todos fundamentalistas violentos que antes de irem para a cama dizem uns aos outros "death to the West". São pessoas como nós, talvez mais pobres e em muitos casos pior informadas e vítimas da propaganda dos dois lados.

Há poucos anos o likudnick Tom Friedman (lembram-se de quando ele tinha alma e escreveu o livro excelente "From Beirut to Jerusalem"?) dizia na televisão que tinha estado na Malásia e tinha visto o show do neo-fascista Bill O'Reilley a gritar palavras de ódio racista contra TODOS os muçulmanos do mundo na FOX. E perguntava-se se aquele ódio racista transmitido ao planeta inteiro não seria um convite aos muçulmanos normais para que tomassem partido nesta guerra entre cristãos e muçulmanos.

E só mais uma coisa. Há uns anos estava com um amigo meu israelita em Portugal e ele perguntou-me onde estavam os árabes? Os jornais da direita sionista falam todos os dias da reconquista da Peninsula Ibérica pelos muçulmanos (para eles "muçulmano" é sinónimo de "papão"). E eu respondi-lhe: "Os árabes somos nós! Os visigodos nunca foram mais de 2% da população!" Ele ia morrendo...

domingo, 20 de abril de 2008

E por falar em pessimismo...

Eu não acredito que os oligarcas que mandam no mundo não tenham planos para o futuro (muito) próximo, quando não houver gasolina nem comida para todos.

E pergunto-me porque será que sendo a maioria dos muçulmanos no mundo pessoas boas, trabalhadoras e agnósticas, como toda a gente, na Europa se persiste em pintá-los como fundamentalistas perigosos.

Ou em escolher os piores dentre eles para serem porta-vozes das respectivas comunidades.

Ou em provocá-los com afirmações do género: se não estão conosco (os cristãos evangélicos), estão contra nós; ou "a ICAR é uma organização pacífica e o Islão é violento por definição".

E também não acredito que nenhum dos colonos europeus e americanos, fundamentalistas e sanguinários, que vive em Israel e alimenta fantasias de expulsar os muçulmanos todos de Jerusalem, vivos ou mortos, e reconstruir o templo da superstição deles, acredite numa via pacífica.

Estará a ideia duma "solução final" para os muçulmanos na mesa? Se não está parece...

Dawkins, Dawkins, Dawkins

Comprei os vídeos dos programas de Richard Dawkins: "The root of all evil?" e "Enemies of reason". Excelentes. Deviam ser obrigatórios em todas as escolas e liceus do mundo.

Na Europa podemos estar descansados que isto não vai acontecer: se Bolonha prova alguma coisa para além de qualquer dúvida razoável é que o Barroso e os amigos estão seriamente empenhados em destruir completamente o ensino público na União Europeia.

Na UE deles não vai haver ensino para os pobres, como não vai haver saúde, nem segurança social. A melhor estratégia para os europeus vai ser ter muitos filhos para os que sobreviverem os alimentarem quando eles forem despedidos por velhice ou doença.

Mas uma das coisas que os documentários de Dawkins trazem para a mesa (embora não explicitamente) é que o recurso à superstição (Lourdes, Fátima, aromaterapia, homeopatia, acunpuntura, etc.) é uma reacção à desumanidade do sistema de saúde público dirigido por CEOs e gestores da Católica em que a única coisa que conta são os tostões. O tempo médio que um médico em Inglaterra dá a um doente são 8 minutos. Os homeopatas levam-lhes um braço e uma perna mas ouvem-nos durante uma hora antes de lhes receitarem água com memória...

Eu acho que o capitalismo isolou as pessoas, destruíu-lhes os direitos um a um, a família, o lazer, a vida social e o optimismo (os europeus são todos patologicamente cínicos). As únicas instituições inclusivas e simpáticas na vida de quem não tem nada são as medicinas alternativas e as rezas (com cantos, como nas igrejas evangélicas).

E nesse sentido estou tão pessimista como Dawkins quando penso no futuro da ciência. Mas não acho que lá porque o príncipe Carlos acredita em coisas absolutamente idiotas se possa dizer que as pessoas sejam hoje mais malucas do que no passado.

Talvez isto seja mais difícil de engolir nas sociais democracias europeias do pós-guerra, onde se gozaram duas ou três décadas de democracia, liberdade e racionalismo. Mas a verdade é que nos últimos 10 mil anos o mundo foi sempre assim, ou pior. Por exemplo: há mais de 220 anos que a Igreja Católica não queima ninguém em público.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

O papa nos EUA

Estive fora, num hotel, e acabei por ler as primeiras páginas do USA Today e ver a CNN à hora do pequeno almoço. O papa está nos EUA e a primeira coisa que fez foi avisar os bispos todos que vêm aí eleições e só um candidato é que é do partido pro-vida.

Conclui-se que as críticas (poucas e sussurradas, aliás) a esta administração psicopata e delinquente, são para inglês ver. Quando se fala em eleições a ICAR está com o Partido Republicano.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Estado divorcia-se da ICAR, parte III?

  • «A lei do divórcio foi hoje aprovada pela esquerda parlamentar e os votos contra do PSD e do CDS-PP (...) O diploma teve o voto contra da deputada do PS Matilde Sousa Franco, a abstenção da deputada Teresa Venda [PS] e mereceu o voto favorável de sete deputados do PSD e a abstenção de 11, entre os quais Pedro Duarte, da direcção da bancada e Jorge Neto. Arménio Santos, Ofélia Moleiro, Emídio Guerreiro, Agostinho Branquinho e Manuel dos Santos foram alguns dos deputados do PSD que votaram favoravelmente o diploma do PS, que acaba com a figura jurídica do divórcio litigioso e estipula o "divórcio por ruptura".» (RTP)
O preâmbulo da lei (segundo a Agência Ecclesia) traça a genealogia do divórcio em Portugal, desde a lei pioneira de Afonso Costa em 1910, passando pelo recuo salazarista com a Concordata de 1940, e pelo Protocolo Adicional de 1975 (devido a Salgado Zenha), que possibilitou o divórcio para os casamentos católicos (ver também este artigo de Fernanda Câncio para uma breve história do casamento em Portugal).

Que os costumes já mudaram em Portugal é um facto. Que o PS comece a acompanhar a evolução social é de saudar. Conforme eu já afirmara há uns tempos, «Portugal está à frente da Espanha no processo de secularização sociológica. Porque será que não há um avanço correspondente na laicização política?». Esperemos que os políticos comecem a acertar o passo com a sociedade.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Um católico laicista

Pode ser-se católico e defender a laicidade, e a prova é o discurso que se segue (via Povo de Bahá).



É curioso verificar que, quase cinquenta anos depois, muito poucos católicos portugueses (e nenhum político católico português...) seriam capazes de ir tão longe na defesa do laicismo (ou laicidade):
  1. Nenhuma autoridade religiosa pode dar indicações de voto;
  2. Nenhuma escola religiosa pode beneficiar de fundos públicos;
  3. Nenhum político aceita instruções do Papa ou da Conferência Episcopal.
O político do filme estava muito à frente...

B-16 larga bomba em cima do pé


  • «Bento XVI (...) reconheceu o modelo positivo de laicidade que o país [EUA] oferece. (...) a relação entre laicidade do Estado e fé nos Estados Unidos é um modelo «fundamental», que deverá ser imitado também na Europa.» (Zenit)
Eu acho muito bem que se siga o modelo laicista dos EUA. Em Portugal, isso implicaria imediatamente:
  1. O fim das aulas de Educação Moral e Religiosa na escola pública;

  2. O fim do pagamento de salários a capelães hospitalares de hospitais públicos;

  3. O fim da existência de um bispo católico equiparado a general ou tenente-coronel;

  4. O fim da Concordata;

  5. O fim da Comissão de Liberdade Religiosa;

  6. O fim dos subsídios a monumentos nacionais que sejam utilizados pela ICAR ou outras comunidades para cerimónias religiosas.
Enfim, Joseph Ratzinger, com estas declarações, aproximou-se de pedir a sua inscrição na Associação República e Laicidade.


[Publicado originalmente no Diário Ateísta.]

terça-feira, 15 de abril de 2008

Re: «Diálogo construtivo»

Na fatídica Agência Ecclesia, encontra-se um texto de Sarsfield Cabral que repete a argumentação habitual de uma ICAR subitamente à beira de um ataque de nervos.
  • «há quem não tenha percebido a diferença entre uma saudável laicidade do Estado, que até torna a Igreja mais livre na sua esfera de acção, e um laicismo tendencialmente totalitário, que, sob uma pretensa neutralidade, visa impor a toda a sociedade uma determinada concepção da vida, da pessoa e da moral»
Ninguém percebeu a diferença porque ela não existe. Ou melhor: só existe mesmo nas cabecinhas clericalistas. «Laicismo» é a teoria; «laicidade» é a práctica. Qual é a dúvida? E quem é que impõe o quê, quando se tenta criar um espaço neutro em que se possa concordar e discordar?
  • «por vezes vemos reacções negativas quando dirigentes da Igreja tomam posições sobre leis que ferem a visão cristã do mundo – leis do aborto, do divórcio, etc.»
Bom. Se tomam posições política em público, não se queixem das reacções. Quando eu defendo uma ideia qualquer, não peço para não ser criticado. Pelo contrário, peço que me critiquem. Não podem esperar tomar posições polémicas, minoritárias e mal fundamentadas, e depois não serem criticados. É assim em qualquer sociedade aberta. Habituem-se.

Alegre sobre a ida de Cavaco à Madeira

  • «Não faz sentido que o Presidente da República se desloque à Madeira abdicando de ser recebido pela Assembleia Legislativa, que é o primeiro órgão do governo próprio da Região Autónoma. É uma forma de transigência inesperada com afirmações do Presidente do Governo Regional que ofendem a Assembleia Legislativa, o Presidente da República e o Estado de Direito Democrático.» (Manuel Alegre)

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Sabor a 25 de Novembro

  • «O secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, afirmou hoje que o entendimento entre o Ministério da Educação da Educação (ME) e os sindicatos do sector sobre a avaliação dos professores criou "muito boas condições" para fazer avançar com o processo.» (Público)
  • «O líder do Bloco de Esquerda classificou hoje o acordo entre o Ministério da Educação e sindicatos sobre a avaliação de docentes como uma “derrota clamorosa da violência do Governo contra os professores" que "demonstra claramente” que “tinham razão ao defender as escolas”.» (Público)
  • «Um "recuo" e "falhanço significativo" do Governo e uma "vitória" dos professores é como o PCP classifica o entendimento de hoje de madrugada entre o Ministério da Educação e os sindicatos de professores sobre o sistema de avaliação.» (Público)
  • «Mário Nogueira, porta-voz da plataforma sindical, disse no final da reunião com a equipa ministerial, que "não existe um acordo. Para isso teria de ser muito mais profundo. Viemos aqui para tentar salvar o terceiro período, a pensar na tranquilidade dos alunos. É um entendimento e uma grande vitória para os professores que mostra que vale mesmo a pena lutar".» (Público)
  • «Foi para isto que estivemos na manifestação dos 100 mil?» (Movimento em Defesa da Escola Pública)

Kosovo e tráfico de órgãos

  • «Carla del Ponte, ex-procuradora do Tribunal Penal Internacional (TPI) para a antiga Jugoslávia, lançou um livro em que acusa o actual primeiro-ministro kosovar e ex-líder guerrilheiro, Hashim Thaçi, de ter sido cúmplice, no Verão de 1999, de um esquema de tráfico de órgãos humanos.» (Jornal de Notícias)
Nos balcãs, tudo é possível...

sábado, 12 de abril de 2008

Rumo à escola «à la carte»

  • «O Presidente da República promulgou hoje o diploma sobre gestão e administração escolar, que já não prevê percentagens mínimas para o número de representantes dos professores e dos pais no Conselho Geral, futuro órgão de direcção estratégica das escolas. O diploma estabelece que o número de representantes do pessoal docente e não docente, no seu conjunto, "não pode ser superior a 50 por cento da totalidade dos membros do Conselho Geral", órgão com competência para escolher e destituir o director. (...) O Conselho Geral (...) aprova o plano anual de actividades, quando anteriormente emitia apenas parecer.» (Público)
Um «Conselho Geral» com maioria de pessoas vindas de fora da escola, e constituído por representantes da estupenda «sociedade civil» (igrejas e empresas, para não ir mais longe), passará a decidir sobre os planos de actividades escolares. Espera-se que em breve as actividades incluam idas semanais à missa, anuais a Fátima, e experiências de trabalho gratuito na empresa de calçado da zona. No futuro, os programas escolares poderão ser adaptados às especificades regionais, de forma a termos Língua Portuguesa madeirense ou açoriana, Matemática algarvia ou minhota, e Filosofia beirã ou alentejana.
Porque será que a ministra não considerou a eleição dos membros do «Conselho Geral» por sufrágio local, e não introduziu uma norma recordando a não confessionalidade do ensino? Seria um pouco melhor...

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Carreira política

  1. Aos 18: tirar um curso qualquer numa universidade, de preferência privada porque dá menos trabalho. Escolher a JS ou a JSD. Deixar a AE para os radicais.
  2. Antes dos 30: ganhar a eleição para a concelhia. Permite escolher os autarcas e influenciar a escolha de deputados.
  3. Depois dos 30: ser deputado. Nem que seja na terceira fila, o essencial é aparecer na televisão.
  4. Aos 40: passar pelo governo local ou nacional. Não importa muito o que se faz, é mais quem se conhece.
  5. Por volta dos 50: retirar-se para uma empresa privada. Ficar a olhar de alto, de preferência num canal de televisão ou numa coluna de jornal.

Ascensão social

  • «“Metade das empresas do PSI-20 tem ex-governantes nos seus órgãos sociais”, denunciou hoje Bernardino Soares, líder da bancada do PCP. Sem nunca referir nomes – à excepção de Jorge Coelho – o dirigente comunista deu outros exemplos de ex-ministros de Obras Públicas que ingressaram em grandes empresas, como Ferreira do Amaral (PSD), na Lusoponte, António Mexia (PSD) na Galp e depois na EDP.
    Bernardino Soares referiu também muitos casos na banca: um ex-ministro PSD (Fernando Nogueira), um ex-secretário de Estado da presidência (Paulo Teixeira Pinto, PSD) e um ex-ministro-adjunto (Armando Vara, PS) no BCP. O Banco Santander recrutou uma ex-ministra das Finanças (Manuela Ferreira Leite, PSD) e um ministro da Presidência (António Vitorino, PS). Foram também referidos "vários ministros e secretários de Estado" que foram para o Banco Espírito Santo, Banco Português de Negócios ou Banco Privado Português.
    Noutras áreas, o líder da bancada do PCP referiu ainda um secretário de Estado da Saúde (José Lopes Martins, PSD) para a administração do Hospital Amadora-Sintra cujo contrato negociou, um ex-ministro do Desporto e da Administração Interna (Fernando Gomes, PS) na Galp, e um ex-ministro das Finanças (Pina Moura, PS) na Iberdrola e na Prisa.
    Nem mesmo a Assembleia da República escapou ao rol: "Até temos um deputado, porta-voz de um partido, e logo o mais representado que é provedor das empresas de trabalho temporário e defende, claro está com toda a independência que a legislação laboral devia ser mais liberalizada", prosseguiu Bernardino Soares, referindo-se ao dirigente socialista Vitalino Canas.» (Público)
Na esmagadora maioria dos casos, estes ex-políticos tornaram-se administradores de empresas ou banqueiros depois de serem governantes. Ou melhor: por terem sido governantes. Até pode não ser ilegal, mas o que fica para o cidadão comum é uma impressão muito desagradável.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

«Nacionalista» confessa querer formar organização paramilitar fascista

  • «Mário Machado apelou hoje à compra legal de armas pelos "nacionalistas" dado que estes serão "o último baluarte" numa iminente "guerra racial e civil" em Portugal, como a que se assistiu em Paris. As declarações foram feitas em pleno Tribunal de Monsanto (...)» (Esquerda.net)
Ou melhor, a organização já está formada. E a PJ já encontrou as armas.

A Constituição da República afirma no seu artigo 46º:
  • «Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, nem organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.» (CRP)
Parece-me claro.

Continua o esbulho Lusoponte

  • «O Estado deverá ser confrontado com um pedido de indemnização de pelo menos 30 a 35 milhões de euros por ano da Lusoponte pela entrega a terceiros, via concurso público, da componente rodoviária da ponte Chelas/Barreiro.» (Diário de Notícias)

Parece que a travessia do Tejo não é da nação, via Estado. Foi privatizada. Há uns senhores chamados Lusoponte que são os verdadeiros donos do Tejo, pelo menos no que toca aos rendimentos económicos de atravessá-lo de carro.

Alguém sabe como se acaba com isto?

terça-feira, 8 de abril de 2008

As propinas que paguem o ensino superior

  • «As famílias e os próprios estudantes (aqueles que trabalham) do Ensino Superior têm amortecido a quebra do montante de investimento público por discente, que se cifrou em menos 12%, quando se comparam os montantes de 1995 e 2004. O investimento privado (famílias) passou de 3,5% para 14% no mesmo espaço de tempo. O desvanecimento financeiro do Estado é quase integralmente compensado pela contribuição das famílias.» (Jornal de Notícias, via Zero de Conduta)
«Progressivamente», poder-se-á caminhar para o investimento zero do Estado no ensino superior. As propinas (ou seja, as famílias) que paguem o ensino superior. Afinal, a formação e a ciência são luxos.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Escolas: da municipalização à escola-empresa?

Infelizmente, a actual crise na escola pública tem sido pouco comentada e analisada fora do âmbito dos movimentos e blogues de professores. No blogue O Reino da Macacada, encontra-se um artigo interessante sobre as possíveis consequências da municipalização em curso da escola pública (já criticada aqui):
  • «A primeira das formas a avançar será a municipalização do sistema, já prevista para 2008/2009. Depressa (se é que já não têm consciência disso) as Câmaras Municipais vão chegar à conclusão que não têm vocação, capacidade, meios técnicos e humanos para gerir com eficiência toda a enorme massa estrutural que lhes vai cair nos braços, com os seus problemas muito específicos e exi­gências muito próprias.
    Daí a passarem a tarefa para “empresas especializadas” transferindo-lhes na totalidade (ou quase) as competências que o governo lhes delegará será um pequeno passo. E, também num futuro não muito distante vamos ver os pro­gramas curriculares (com excepção dos programas estruturantes de língua materna, matemática e língua estrangeira – inglês) serem decididos pelos gru­pos de cidadãos com interesses religiosos ou económicos ou outros. Natural­mente, nenhuma dessas empresas funcionará por “amor à causa” ou por cari­dade. O seu objectivo será a produção de mais valias – o lucro!
    (...) Os prejudicados serão, em larga medida, os menos favorecidos. A excelência ficará reservada para as elites.» («A agenda oculta da educação»)

Caroline Fourest sobre o filme de Wilders

Ainda sobre o filme de Geert Wilders (ver aqui a minha opinião), a opinião de Caroline Fourest:
  • «Vers la 10ème minute, Wilders fait le lien entre ces images de haine et le nombre grandissant de musulmans aux Pays-Bas, pour finir par dénoncer l’« islamisation ». Son film ne vise donc ni l’islamisme ni même l’Islam en tant qu’idéologie religieuse, mais le fait qu’il y a trop de musulmans en Europe. C’est un message xénophobe. En cela, le film de Wilders est très différent de Soumission, écrit par Ayaan Hirsi Ali et réalisé par Théo Van Gogh, qui s’attaquait aux versets sexistes du Coran de façon féministe et anti-religieuse. C’est un message opposé à celui de Charlie Hebdo, relaxé de l’accusation d’incitation à la haine, puisque notre traitement de l’affaire des caricatures de Mahomet visait clairement les intégristes, et non les musulmans.» (Respublica)

quinta-feira, 3 de abril de 2008

O terrorismo kosovar lava mais branco

  • «Ramush Haradinaj, ex-primeiro-ministro do Kosovo e antigo comandante da guerrilha albanesa, foi hoje ilibado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) para a ex-Jugoslávia, onde estava acusado de crimes de guerra e crimes contra a humanidade por perseguição e homicídio de civis sérvios. (...) O próprio colectivo admitiu que o resultado do julgamento possa ter sido influenciado pela recusa de várias testemunhas em prestar declarações ao tribunal. Intimadas pelos juízes, algumas testemunhas acabariam por deslocar-se a Haia, mas admitiam que tinham sido avisadas para não falarem. “O tribunal ficou com a forte impressão de que o julgamento decorreu numa atmosfera em que as testemunhas não se sentiam seguras”, afirmou o juiz presidente.» (Público)
Não há dúvidas. Os kosovares são os únicos muçulmanos do mundo que podem recorrer ao terrorismo impunemente. Porque será?

Re: «Liberdade» económica?

Parece que eu e o Miguel Botelho Moniz não nos conseguimos entender. Apesar de eu lhe ter perguntado explicitamente o que é a «liberdade económica» dele («A "liberdade" de não pagar impostos? A "liberdade" de pagar salários baixos? A "liberdade" de despedir mais facilmente?) continua sem o explicar, e prefere entreter-se a debitar nomes e a acusar-me de «[ter] uma visão colectivista de “cidadãos”» e de aceitar «um conceito de “vontade geral” e de sujeição do indivíduo à mesma». Como a discussão começou a propósito de Raúl Proença, talvez valha a pena citá-lo novamente:
  • «(...) é preciso proclamar com toda a energia que nunca um verdadeiro democrata pode reconhecer ao Estado qualquer poder absoluto sobre o indivíduo. O que é o Estado para ele, efectivamente, senão um instrumento destinado a permitir ao indivíduo uma vida verdadeiramente livre e digna do homem? A democracia visa servir o indivíduo e não oprimi-lo. (...) Seja, porém, como for, a primeira verdade a pôr em evidência é que é no direito individual, e não no direito do número, que reside a essência da democracia. (...) se a unanimidade fosse condição imprescindível da criação do direito, estaríamos dentro da mais pura democracia, mas fora da vida. (...) Quanto à pretensa vontade geral (...) é uma concepção mística que desconhece a contingência de toda a vontade e se revela apta a constituir-se em razão justificativa de toda a espécie de tirania.» («Da necessidade prévia de defender a democracia das suas aberrações», Seara Nova nº158, 25 de Abril de 1929)
Enfim, o texto referido continua com uma crítica de Rousseau, que Proença considera, de certo modo, um precursor do bolchevismo e do fascismo, e ao qual opõe Voltaire.
Em matéria de política, há muito que deixei de ter ilusões sobre «sociedades perfeitas» e «pessoas puras», e por não ter essas ilusões não me surpreende que os políticos não cumpram as suas promessas eleitorais ou que cedam aos seus interesses pessoais. Simplesmente, a boa e velha democracia parece-me uma melhor defesa contra esses «azares da vida» do que o «liberalismo» de alguns, que me parece ser, mais do que uma preocupação com a liberdade individual, um discurso quase exclusivamente preocupado com a crítica da democracia. É que o banqueiro e o sem-abrigo não são igualmente livres...

Se todos os religiosos fossem assim...

No Povo de Bahá, o Marco Oliveira escreve o seguinte, depois de citar o argumento de Dawkins sobre os rótulos religiosos que se colocam às crianças:
  • «Lembrei-me desta opinião do Professor Dawkins depois de recentemente ter ouvido a expressão «crianças bahá’ís». É algo que não faz sentido. O mais correcto é usar a expressão «criança de família bahá’í». Aliás, a adesão à Fé Bahá’í só é permitida após os 15 anos de idade; espera-se que a partir dessa idade os jovens tenham a maturidade necessária (e a liberdade suficiente) para decidirem por si próprios se desejam ou não ser bahá’ís. Note-se que isto não representa uma quebra de compromisso com a minha religião, ou uma qualquer hesitação na minha fé. Irei tentar passar os meus valores e as minhas convicções religiosas para os meus filhos; se não o fizesse, aí poder-se-ia questionar a minha fé. E se eles um dia se tornarem baha’is, espero que isso seja fruto de uma decisão pessoal - livre e amadurecida -, e não apenas o resultado de pressões externas.»
Se todos os religiosos fossem assim, não haveria necessidade de sermos anticlericais. Mas os bahá'ís, honra lhes seja feita, são um caso tão atípico de religião sem clericalismo que até elegem anualmente os dirigentes das suas comunidades.

O mundo muçulmano seculariza-se (em silêncio)

Não há como exagerar a importância da chamada de atenção que Rui Pena Pires faz no (felizmente regressado) Canhoto: no mundo muçulmano, a alfabetização de mulheres e homens progride, a endogamia diminui, e a fecundidade está em queda (ver o impressionante quadro da evolução do número de filhos no Líbano).

A alfabetização e a urbanização são componentes inevitáveis da modernidade, mesmo para ditaduras religiosas que não apreciam os efeitos secundários desses processos. As indicações de que os xiítas do Líbano passaram de sete para dois filhos por mulher, no espaço de trinta anos, é um sinal de que se passa algo na privacidade das casas muçulmanas de que raramente se fala na Europa: informação e contracepção, presumivelmente sem consulta aos mulás. O que também ajuda a relativizar o «alarme demográfico» que a extrema-direita faz soar com frequência na Europa.

[Publicado originalmente no Diário Ateísta.]

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Perdão?

«Jaime Gama (PS) disse, na sexta-feira passada, que o líder do governo regional da Madeira é "um exemplo supremo na vida democrática do que é um político combativo", adiantando que a região é "a expressão de um vasto e notável progresso no País".»

Se Jaime Gama disse isso ontem, acho que levou a simpática tradição do dia 1 de Abril longe de mais. Se não foi o caso, não tem desculpa.

É bom que Edite Estrela e Ana Gomes já se tenham demarcado veementemente destas anedóticas declarações, chamando-lhes isso mesmo. Haja alguma decência, apesar de tudo.

Contratos desiguais e entre iguais

Na trincheira neoliberal, há quem tenha tentado explorar uma suposta contradição entre a legislação do divórcio unilateral desejada por dois partidos de esquerda, e a oposição de parte da mesma esquerda à unilateralidade de despedimentos e outros contratos.
A razão porque a contradição não existe é que um casamento, felizmente, é um contrato entre iguais; e um contrato de trabalho entre uma multinacional e um desgraçado qualquer é uma relação de poder, muito desigual, entre quem paga e quem é pago.
Liberdade para se divorciar, claro que sim. Liberdade para despedir na hora e sem reparações, claro que não. Mais uma vez se confirma: liberdade sim, mas igualdade também.

Alguém que sabe o que diz

É raro encontrar um blogue que mereça tão rapidamente o meu interesse. O As Minhas Leituras merece ser lido do princípio ao fim. Ide à página principal e lede as reflexões que lá estão sobre autoridade, liberdade e responsabilidade em contexto escolar. Aprendereis mais do que em todos os artigos de opinião dos jornais.

Agitar um espantalho para pedir dinheiro

As palavras de Jorge Ortiga, já referidas pela Mariana, merecem mais um pequeno comentário.

Quando o líder da CEP afirma que «o Estado democrático não pode ser militantemente ateu», eu concordo. Simplesmente, um Estado militantemente ateu mandaria fechar as igrejas, eventualmente poderia prender sacerdotes apenas por o serem, e promoveria o ateísmo através do sistema de ensino, com aulas refutando explicitamente o teísmo. Foi o que aconteceu na Europa de Leste em maior ou menor grau, com variações de espaço e tempo consideráveis, mas todos os laicistas portugueses condenam hoje esse género de práticas políticas. Ninguém em Portugal, que eu saiba, defende o ateísmo de Estado. Ortiga gosta de confundir laicidade de Estado com ateísmo de Estado, naquilo que é a típica táctica de agitar um espantalho.

Em segundo lugar, quando Ortiga pede que «[o Estado procure] satisfazer a opção dos cidadãos a quem proporciona as condições necessárias para viver a sua religião», pede no fundo que a religião seja apoiada activamente pelo Estado. Acontece que a religião, ao contrário da saúde e da educação, não é um direito social. É um direito político e cívico. As confissões religiosas só podem pedir ao Estado que garanta a liberdade individual de professar ou mudar de religião, a liberdade de associação, e a liberdade de manifestar a sua crença ou mantê-la privada. Tudo o mais (subsídios ao culto, isenções fiscais, aulas de religião na escola pública, capelães hospitalares pagos pelo Estado), é um abuso que terá um dia de terminar. Esperemos que amanhã seja a véspera desse dia.

[Publicado originalmente no Diário Ateísta.]

terça-feira, 1 de abril de 2008

Revolução na cosmologia

O Esquerda Republicana deve ser o primeiro (e o único?) blogue da lusa blogo-esfera a noticiar esta verdadeira revolução cosmológica.